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PROBLEMAS DO ENSINO À DISTÂNCIA NO BRASIL

 
 

 Prof. Dante Donatelli
São Paulo/Brasil
Dddonatelli@hotmail.com

 

Resumo

Palavras chaves: educação a distância, economia, educação formal.
Os problemas estruturas estruturais que levam o Brasil a ter uma EaD incompatível com as suas dimensões e necessidades.

BREVE INTRODUÇÃO

Por séculos o Brasil, ou melhor as elites brasileiras se recusavam a admitir o dever do Estado com a educação pública e gratuita a todos os cidadãos. Foi somente na Constituição de 1946, logo após mais um período ditatorial que foi assentado o dever do Estado para com a educação mínima de todos os cidadãos.

Uma sociedade autoritária, elitista e segregadora economicamente, até hoje o Brasil tem os piores índices de divisão de renda das Américas e se localiza entre os cinco piores do mundo. Os 10% mais rico no Brasil detêm algo em torno de 41% de toda riqueza nacional, sobrando para o resto, o resto.

Contextos históricos como estes, que lentamente vão sendo superados, com duras lutas pela democracia e cidadania, uma maior democratização das instituições e dos serviços e benefícios sociais, no que tange a distribuição da renda são pífios, para não dizer ridículos diante da miséria que assola mais de 25% da população brasileira.

Democracia e miséria convivem da mesma forma que casais que coabitam com a sogra, convivem, porém sob tensão constante. O modelo escolar brasileiro reflete esta coabitação tensa e problemática advinda de um rool de problemas históricos, muitos deles fruto da pobreza sob a qual vive a maioria do alunado.

Esta pequena localização socio-histórica-economica é tão somente para que se tenha uma brevíssima visão da nossa história da educação de base, já que vamos nos ater ao ensino universitário e mais especificamente na suas modalidade à distância.

A Universidade no Brasil é um fenômeno novo, não que não houvessem escolas de ensino superior, haviam, porém eram elas muito poucas e voltadas a uma elite privilegiada. Hoje, após as avalanches neoliberais de cunho terceiro mundista que nos assolou associadas a um profundo desprezo pela Universidade Pública houve um boom do ensino de terceiro grau.

Desde a década de setenta a ditadura já havia apontado para o subsidio do ensino universitário privado brasileiro, porém a abaixa expansão do ensino médio conteve o crescimento das escolas de terceiro grau privadas.

Com a onda neoliberal dos últimos doze anos as escolas privadas de terceiro grau conheceram, e ainda conhecem um crescimento espantoso, mesmo que em números pareçam ridículos, para uma nação de 170 milhões de habitantes a sua população universitária não ultrapassa os 3%. 

Porém, gostaria de me deter no modelo universitário em voga no Brasil. O primeiro deles é a forma de pagamento dos professores, idêntica ao ensino médio, por hora-aula, um segundo ponto é ausência de projetos de pesquisa na esmagadora maioria destas instituições privadas, até porque um professor horista não tem como realizar qualquer tipo de pesquisa.

Junto a isso, e não nos furtamos de afirmar que há esforço do poder público, do Ministério da Educação no sentido de melhor tal quadro, mas ele ainda é difícil de ser visualizado enquanto efeito prático. Um terceiro ponto que noto é mercantilismo exacerbado sob o qual se coloca a educação universitária no Brasil. Um mercantilismo de efeitos devastadores, pois busca o retorno do capital investido em tempo cada vez menor o que coloca a questão da qualidade de ensino como uma coisa menor, ou no melhor dos casos como secundária.

Na outra ponta do problema se colocam as Universidade públicas, donas de respeitabilidade, projeto, professores bem formados e medianamente remunerados mas sistematicamente abandonadas a própria sorte, já que exigüidade de recursos e a falta uma clara política de investimentos de longo prazo tornam a sua produtividade e as ações um risco.

Mesmo diante deste quadro é na Universidade pública onde estão todas as referências de qualidade de ensino no Brasil, fora delas em uma ou outra fundação como as Pontifícias Universitárias é que se salvam.

Apenas no intuito que esclarecer, o estado brasileiro mais rico, São Paulo tem uma população de 35 milhões de habitantes e aproximadamente 6 milhões de alunos na escola pública, do ensino fundamental ao médio e mais 2 milhões de alunos nas escolas privadas. Destes números astronômicos, maior que muitas populações de países latino americanos e europeus, constata-se que existem apenas 3!! (três) universidades públicas no estado de São Paulo que tem no máximo 18 mil!!! (dezoito) vagas a serem oferecidas anualmente.

Conclui-se daí que são estas universidades um local de elite, os mais afortunados e melhor educados é que conseguem ter acesso aos seus bancos, restando aos demais o consolo das universidades privadas, em sua maioria, caras e mal preparadas em todos os sentidos.

A escola pública vive na relação inversa da universidade pública, o que esta segunda tem de prestígio, respeitabilidade e reconhecimento, pela sua excelência, quem sabe até por seu elitismo, a escola pública é o lugar mais do dever, no qual a qualidade de ensino, para que não arrolemos outros fatores vão de ruim a péssimo.

Em um quadro como este a vida do aluno de terceiro grau no Brasil acaba sendo como uma continuação, por vezes piorada da sua vida como aluno secundário, e aqui gostaria de adentrar o nosso problema central que o Ensino à distância no Brasil, as reflexões que se seguem sustentam-se nas evidências destes fatos brevemente relatos acima. O que afirmarei a seguir é verdade, porém deve ser contestada, já que o que segue é a meditação e não a aferição empírica de fatos[1].

ALGUNS PROBLEMAS do EaD

  Estamos nos centrando no Ensino à Distância para o seguimento de terceiro grau, antes de mais o fato é que, esta forma de aprendizagem ainda não é uma realidade brasileira, muito se especula, porém pouco se tem de concreto.

Uma primeira abordagem que me toma são as palavras de alguns proprietários de instituições de ensino de terceiro grau, enfáticas quanto ao ensino à distância, “ele não dá lucro.” Ou “ainda não vi ninguém ganhar dinheiro com isso!”. O empresariado, em especial aquele que se voltou para a educação no Brasil, em sua maioria, sofre dos males de uma economia travestida de liberal, no qual historicamente o Estado serviu como anteparo contra crises financeiras e com subsídios de toda ordem para evitar riscos.

Em uma singela síntese, muito da educação privada, como o modelo econômico que perdurou no Brasil era de um Estado protetor do capital e fechado o suficiente para que não houvessem grandes riscos de concorrência.

A mentalidade de uma capitalismo provido de uma rede de proteção, no qual o Estado era esta rede, serviu para criar uma mentalidade imediatista e ao mesmo tempo acovardada na maioria das elites econômicas. Capitalismo sem risco, foi esta a lógica do capital no Brasil.

No contra ponto poderia se pensar na Universidade pública como lugar privilegiado no qual a se promova o ensino à distância, ledo engano. A medida que o Estado brasileiro se democratizou ele também tangenciou por um caminho neoliberal como a mandava a cartilha do mundo atual.

Ao buscar abrir a economia e retirar do Estado uma série de deveres, e por conseguinte abrir o capitalismo ao riscos normais, o que ocorreu foi uma brutal abandono da Universidade Pública no Brasil, pois em verdade o Estado em condição pré falimentar acabou se detendo em outras prioridades.

Na refluxo deste quadro as Universidades privadas avançaram com voracidade sobre o “mercado” a busca de uma alunado que saia do ensino médio em quantidades até então nunca vistas no Brasil. Apenas como dado de referência, entre 1993 e 1998 houve um crescimento de 37%, em média de aluno formados no Ensino Médio. Por outro lado, a estabilidade econômica brasileira, depois de vinte anos de inflação alta, só para se tenha uma idéia dos efeitos devastadores da inflação brasileira, entre 1983 e 1993 o país teve seis!!! Moedas, ou seja desvalorizava-se a moeda e mudava de nome fazendo uso de planos milagrosos que acabavam por dar em nada.

Economia estável, abertura da economia encolhimento do Estado, além de uma expansão da base instalada de salas de aula para o ensino Médio, corroboraram para que houvesse esta explosão de alunos dispostos, eu afirmo como sendo dispostos, e não preparados, para entrar na Universidade.

O encolhimento da Universidade pública, e a sua manutenção como espaço das elites, favoreceu a que as Universidades privadas pudessem rapidamente aumentar as suas vagas amealhando números cada vez maiores de alunos, porém a questão que se coloca, é, por quê não se investiu no Ensino à Distância público, já que as instituições privadas sequer a colocavam como possibilidade, seja pelo alto custo, seja por ignorância. Por quê?

Ao insistirmos na idéia de uma ensino à distância, público, e se não fosse gratuito ao menos a um custo razoavelmente baixo, fazemo-nos pensando em números muito objetivos. Primeiro que a massa salarial dos trabalhadores brasileiros declinou vertiginosamente nos últimos cinco anos chegado a encolher algo de 6,5%, na outra ponta os dados de seremos uma das cinco piores nações que dividem a renda. Por conseguinte, somos um país rico com uma população pobre, muito pobre.

Estamos nos atendo a realidade econômica brasileira, porém é ela um dado que não pode ser desprezado, e a ela colcocam-se mais dois dados importantes, de uma lado os altos índices de inadimplência nas universidades privadas, nunca declaradas por seus donos mas que giram em torno de 16% até 24%, algo que comprovei como diretor de uma instituição privada. Do outro lado a idade avançada na maioria esmagadora dos nossos alunos de terceiro grau. A idade média gira em torno de 26 anos, quando nas universidades públicas é de 19,5 anos.

Um público mais velho que revela as imensas dificuldades de seguir estudando, por vezes são necessários vários anos de espera para se possa ingressar na universidade, pois o custo é alto, muito alto, e em megalópoles como São Paulo e Rio de Janeiro tornam-se ainda mais caras, pois é preciso arcar com os custos de alimentação, locomoção, que no Brasil é cara e de péssima qualidade, veja o número de quilômetros de metrô construídos nestas duas cidades, ridículos, não chegando a uma centena em cada uma delas, além do custo de manutenção da vida escolar.

Em tudo, estudar é um ato de esforço e dedicação pessoal no anseio de se construir um futuro melhor, com mais oportunidades e melhores salários.

Mas é do outro lado, no lado pedagógico que creio resida a maioria dos problemas para que ensino à distância seja uma realidade no Brasil. Que tipo de aluno se exige de uma ação formadora como esta? Evidentemente que não é ele um sujeito igual aquele que se senta todas as noites nos bancos das instituições de terceiro grau.

O aluno, antes deve ser alguém provido de uma grande auto disciplina da qual, ninguém, do tutor aos familiares, ninguém além dele mesmo pode faze-lo capaz de se dedicar ao aprendizado e as tarefas colocadas no processo de ensino-aprendizagem. Ora, nossas escolas de ensino fundamental e médio ensinam nossos alunos a estudar? Ensinam a serem autônomos? Ensinam a serem sujeitos da sua formação?

Não. Efetivamente não. A escola brasileira, depois dos anos de massacre patrocinado pela ditadura militar (1964-1983) sofre com um vazio pedagógico enorme. Este vazio é parte da falta de um princípio que norteie as práticas e as reflexões cotidianas da escola. É impossível encontrar alguém que consiga definir claramente quais são os princípios que gerem as nossas escolas.

Ter princípios não é um luxo de escolas privadas, é o que torna possível oferecer a cada aluno estratégias claras de compreensão, superação e entendimento do conhecimento humano. E este processo demanda critérios que se definem nas práticas pedagógicas de cada professor, de todos os professores.

Ao permitirmos que o vazio nos faça frente, a escola tornou-se um lugar de voluntarismos, no qual cada um impõe aquilo que ele, enquanto indivíduo e profissional concebe como sendo “correto” de ser feito em sala de aula. Ser construtivista, socio-construtista, conservador e tradicional, ou libertário não importa, o que importa é a escola como instituição pública pudesse ser vista sob uma única ótica geradora.

Pouco vale se alfabetizamos nossos alunos lendo Emília Ferreiro e Piaget se ao chegar ao Ensino Fundamental cada professor que adentra a sala de aula outorga uma regra para se estudar, para se aprender, para se conhecer. Em verdade tem-se tudo, e não se tem nada, e cabe aos alunos serem decorativos com alguns professores, criativos com outros e quem sabe, inteligentes com outros tantos.

Longe de nós estar pregando uma vocação de ortodoxia para a escola, estamos sim pregando a sua volta a condição de instituição reflexiva por excelência e por conseguinte responsável por envolver seus educandos em princípios elementares que os auxiliem no seu desenvolvimento intelectual.

Quando afirmamos que os alunos não tem disciplina por não saberem estudar, e por isso são incapazes de se sentirem donos do seu saber, como é possível, então, pensa-los em um contexto de auto aprendizagem e autonomia intelectual? Dirão os otimistas que a força de vontade, o desejo da aprendizagem como caminho para uma vida melhor, como já afirmamos a cima, ao nos remetermos aos alunos que freqüentam a universidade presencialmente, a diferença é que eles estão, não em uma universidade de fato, mas sim em um ensino médio melhorado(??), em alguns casos é até piorado, e nas práticas cotidianas se valem de artifícios e meandros para superar as dificuldades de sala de aula. Infelizmente eles não conseguem, não sabem como estudar, como mover-se em um espaço de auto aprendizagem.

Em nosso entender é este um ponto nevrálgico, pois a discussão do ensinar a estudar é algo um tanto distante da nossa escola. Estamos tão preocupados em oferecer o básico, o essencial que deixamos de lado o próprio significado do ser aluno, que é estudar.

Suponho que seja necessário colocar na ordem do dia da escola a pergunta como se estuda? Qual disciplina, a formal das atitudes ou a intelectual? Como se cria o caminho para o saber? Creio que se não fizermos isso com urgência a escola continuará a mercê de si e das suas práticas extemporâneas e passageiras, na qual cada professor resolve os seus problemas em cada sala de aula, com cada grupo de aluno, com cada aluno.

Ensino à distância é um desafio tecnológico para países de dimensões continentais como o Brasil, mas antes é um desafio pedagógico, preparar os alunos para serem auto suficientes, para se educarem com autonomia e disciplina. Seremos capazes de realizar a tarefa de trazer cada vez mais cidadãos para plano privilegiado daqueles que sabem, se pudermos, também, cumprir a tarefa política de superar as desigualdades brutais da realidade brasileira. Por outro lado é necessário ter coragem política para fazer da educação pública e gratuita uma prioridade efetiva e por último abrir as portas da escola fundamental e média para os debates acerca das suas prioridades, afinal, qual o fim da escola? Escola precisa ter princípios ideológicos, políticos e pedagógicos? Não só precisa, como tem o dever de possuí-los.

A infra estrutura tecnológica não fará de nós uma nação capaz de superar os desafios da educação à distância, é preciso antes, muito antes, enfrentar as estruturas carcomidas e viciadas pelo pragamaticismo escolar e as mazelas de uma sociedade injusta.



[1] - Os dados estatísticos que foram dados acima e os que se seguem podem ser  conferidos no site www.ibge.gov.br, no qual os números podem ser cotejados e melhor apreciados.


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